San Quentin, 27 de setembro de 2028.

Faz tempo que não escrevo nada. Não tive muito tempo. Não dá pra ficar na cela esperando o Rick vir aqui me comer. Tive que me livrar dele. Tô trabalhando nos banheiros, limpando a nossa merda. Como se isso ajudasse a tirar o sujo de dentro de nós...

Conheci um mané chamado Rob. Um italiano franzino, mas esperto como um tira. Ele é o maior fornecedor de tetas (é como chamam as drogas por aqui). Eu não usava nada desde que o Richard nasceu, mas chega uma hora em que a esperança fica muito longe e a única coisa que importa é esquecer a dor.

O Rick não gosta que eu use tetas. Tô nem ai pro que aquele hipócrita pensa! Também tô fudendo em querer saber como é o esquema de tetas daqui. Como chegam, quem traz,... Ainda tenho uns cigarros e dois tênis: vai dar pra ter alguma coisa por esses dias. Depois? Arrumo um jeito de conseguir dinheiro. Melhor perder tudo do que aguentar sóbrio a dor da humilhação...

E você, caderno do inferno, sabe o que é essa dor? A dor pela vida, pela morte, pelo acorrentamento, pela lágrima, pelo sistema que te engoliu antes mesmo de você tomar consciência de que ele existe.

Todos são viciados. Uns em heroína, outros em sapatos, outros em fazer sexo com crianças, outros em trair a mulher. Loucos dentro e fora da cadeia. Convivi com eles por toda a vida. Sou um deles? Claro! Um viciado em lama, em dor, em escuridão, em morte.

Lembro que quando criança, sentava ao pé da cama do orfanato e rezava quase dormindo. Às vezes procuro, no pior da dor, o Deus da Trindade. Mas acho que ele está muito bem, sentado no trono de ouro no céu, pra lembrar de um viciado como eu.

Um padre tentou pregar pra mim ontem. O mesmo padre que reza pelos mortos daqui; mortos de guerra... Se Deus está em mim, ele é um câncer. E eu sou a merda chapada que limpa as privadas.

Daria tudo por um radinho de pilha agora...

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