Feliz aniversário

Faziam dois meses que Corey tinha ido embora com sua nova família, mas para Kurt pareciam dois anos, sem seu único amigo. Era o saco de pancada de todos os grandões mal-encarados do orfanato. Nunca soube o porquê do ódio gratuito, mas estava cansado de tentar entender. Estava cansado de tentar entender muita coisa no mundo...
Recebeu uma única carta de Corey nesse tempo.
"Deve estar tão feliz com sua família, sua irmã... Tem que aproveitar mesmo!" - Pensava, tentando o conforto.
Nela, ele dava o endereço de sua casa em San Francisco para que Kurt fosse visitá-lo quando pudesse sair do orfanato. Não deixava claro se ele poderia morar lá.
Estava chegando o dia do seu aniversário de 15 anos. Mas não tinha muito o que comemorar... Irmã marcella tinha viajado há muito e acreditava que não voltaria à tempo. Engano seu. Ao acordar naquele dia, viu sua "mãe" sentada na cama, fitando-o com seu olhar profundo e angelical, como sempre.
Mas algo estava diferente...
- IRMÃ!
Abraçou-a ao máximo que podia.
- Soube do que aconteceu, da adoção do Corey. Estou muito feliz por ele, e você também deve ficar!
- Mas eu tô, Irmã! Eu tô!
- Não é isso que está transparecendo, Kurt... Já fiquei sabendo. Não quero você triste. Quero você alegre e principalmente forte.
- Isso ai é um presente pra mim? - Kurt não disfarçava o olhar. E as mãos querendo alcançá-lo.
- Sim! Abra!
O olhar de surpresa e alegria logo foi abafado.
- Um livro?


- SIM! UM LIVRO! O MELHOR PRESENTE QUE QUALQUER UM PODE RECEBER! - Disse, exacerbada, sorrindo e tentando fazer um cafuné pra bagunçar aquele cabelo liso e loirinho do menino. O menino conseguia rir como há muito não fazia.
- Sei que está sendo difícil, Kurt, mas você não imagina a força que tem, que corre em suas veias...
- Como assim, Irmã?
- Você tem um futuro promissor, meu filho. O amor, a justiça e a força está no seu sangue. Nunca esqueça que, dentro de você, o bem será maior que qualquer mal do mundo.
Kurt não conseguia entender e isso era perceptível.
- Apenas guarde as minhas palavras dentro do coração, Kurt. E esse livro também. Nunca deixe de ser a criança que é. Nunca perca a esperança.
- Okay... Mas por que... Parece até que a senhora está...
- Eu... preciso ir embora, Kurt.
Kurt arregalou os olhos. Estava realmente perdendo tudo o que tinha.
- POR QUE A SENHORA ESTÁ INDO EMBORA?
- Kurt, fui enviada a outro lugar. Eu sou de Cristo e vou pra onde ele me mandar, entende?
- E POR QUE CRISTO NÃO ME QUER PERTO DA SENHORA? POR QUE?
Ela não sabia o que responder.
- Não posso ficar, Kurt. Não posso... - A Irmã segurava as feições para não chorar. O mundo do garoto desabava de novo. Mas não poderia chorar. Homens não choram.
- Quero que você fique bem, Kurt. Siga sua vida e seja feliz. Quem sabe não nos encontramos de novo? Vou estar sempre me informando sobre você.
- Okay...
Kurt conseguiu sentir em sua cabeça as lágrimas da Irmã, quando o beijou. Levantou-se e foi à janela, enquanto a Irmã saía apressada, tão triste como ele.



Kurt não gostava nada de despedidas. Se fosse fazer algo, tinha que ser logo, enquanto estavam todos estavam distraídos com a despedida da Irmã Marcella.
Daqui a algumas horas ele não teria mais motivos de estar ali. Se fosse pra mudar a sua vida, tinha que ser no seu aniversário, no seu dia de sorte.
Colocou em sua mochila tudo que achava importante para chegar em San Francisco:
  • Lençol (para não sentir frio no ônibus);
  • 2 blusas e 2 sweaters (Pra quê cuecas?);
  • Mini-game;
  • Suas revistas da Playboy - incluindo a da Katrina Darling;
  • O bendito livro que ganhou;
  • A bendita chave que tinha desde sempre, no pescoço;
  • Dinheiro acumulado dos gramados limpos dos vizinhos.
Além do:
  • Violão - nas costas.
Ouviu passos vindos do corredor. Guardou a mochila debaixo da cama e fingiu tocar o violão.
- Kurt? Não vai descer? - Era Irmã Marcella, com seu sorriso doce.
- Sim, sim! Já já, Irmã!
Ela se aproximou e o pegou pelo braço.
- Venha! Você não vai se despedir da sua mãe?
Não pode dizer não, assim como não pode discutir nenhum argumento revoltado. Foi com ela à cozinha, quando foi surpreendido por um bolo solitário na mesa.
- FELIZ ANIVERSÁRIO!
Não pode conter o sorriso e a felicidade. Ela saiu do meio das outras irmãs, em sua despedida, para não o deixar sozinho.
- Irmã Marcella, eu não uso mais chapéuzinho! Isso é coisa de criança!
- Seja sempre uma criança, menino Kurt... Seja sempre uma criança...
Por que discutiria? Apesar de tudo, sentia-se feliz. Mas sabia que aquela felicidade não duraria muito. Logo ela iria embora, assim como foram seus pais, Corey,...
- Vou amanhã ao meio-dia. Você vai me deixar no jardim?
Ele não respondeu.
Não comeu todo o bolo; levaria, discretamente, alguns pedaços para o quarto (para a viagem). Na porta da cozinha, disse:
- Boa viagem, Irmã. Fique bem.
- Fique sempre com Deus, meu filho. Ele estará sempre com você.

Pela manhã, sua cama estava arrumada - de um modo como nunca deixara. Seu carrinho azul, que ganhara aos 10 anos da irmã, estava lá, em cima da cama, com o seguinte bilhete:

Mãe Marcella.
Quando a senhora estiver lendo isso, estarei a caminho do meu futuro. Por favor, não me procure: não vou voltar pro orfanato. Vou ficar bem, tá?
Vou lembrar desses anos que passei aqui, mas todo mundo tem que crescer.
Que a gente possas se ver um dia, quando tudo estiver bem. Onde a senhora estiver, terá orgulho de mim.
Que Deus se lembre sempre que a gente existe.
Até mais,
Kurt Alan Mustaine.

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